Sempre um presente é uma coisa especial que traduz muito da
pessoa que presenteia. Perceber as particularidades de cada um é o que eu mais
gosto quando os ganho.
Na semana passada a França chegou pelos olhares da Nana e da
Isa. Duas lindas que vieram cheias de histórias para contar. Um dos presentes
que a Nana me trouxe é incrível. Um livro chamado “Receitas de Guerra”, do
Auguste Jotterand, ilustrado por Daniel Nadaud, pela editora Héros-Limite, em
1917. Imagino que a apresentação devia ser parecida com a atual, uma brochura.
E me perguntei quem, em tempos de primeira guerra mundial, estaria preocupado em
fazer um livro de receitas? E prá quem?
Pois está tudo lá. O autor explica seus motivos logo na
apresentação e propõe comidas nutritivas e gostosas com até 150% de economia. Diz
estar respondendo ao pedido de pessoas que lhe demandaram o livro. Parece que os
ingredientes mais escassos eram as carnes e ele propõe alternativas saudáveis
por preços possíveis. Rodei o livro do começo ao fim, pois para mim, é
inusitado que alguém em tempos de guerra escreva um livro de receitas (só na
França uma coisa dessas). Posso ver o lema francês “jamais descuidar do que se
come, faça chuva, sol, mesmo que bombas estejam sob nossas cabeças e fuzis aos
nossos pés”.
Temos o privilégio da não experiência da guerra e acho que
nosso imaginário relaxado não dá conta de avaliar o que seria uma. E depois
desse livro posso compreender ainda mais os franceses, seu orgulho e talento
pela culinária e suas lindas apresentações. Através da comida, conseguiram
manter-se identificados e organizados mesmo nos tempos mais difíceis. Não é
incrível?
O autor aconselha conservas de ovo, de pão e salga de peixe
para armazenamento já que não se sabia quanto tempo a guerra ia durar. A
combinação batatas com queijo aparece em duas receitas: uma gratinada e outra
de batatas douradas com cebola e queijo.
Aí chegou a Isa com “mignotes provençales” que são micro
marzipans de amêndoas, melão e casca de laranja confitadas, com açúcar por cima
e hóstias por baixo. Lindos e deliciosos. Fizemos um chá, saboreamos os docinhos, falamos da vida e, quando ela saiu,
pensei que naquele mini docinho moravam muitas histórias. E que nós, ao
sentarmos em volta deles continuamos a construí-las: me deu uma emoção. E vive la
vie!