quarta-feira, 10 de abril de 2013

Mani, comida técnica e calor


Se você quer conhecer alguém que aprecia uma novidade, muito prazer. Sou uma dessas pessoas. Adoro tanto aqueles que conseguem aprimorar uma tradição ao ponto de ressignificarem um bolinho de arroz quanto os mágicos inovadores capazes de transformar pelo em ovo. O fator comum é perceber a mente e o coração vibrando juntos. E o forno e o fogão cozinhando alquimicamente.
Há anos queria ir comer no Mani, restaurante premiado de São Paulo, sob a batuta do casal Helena Rizzo e Daniel Redondo. Nunca dava: precisava de reserva, toda vez estava lotado, os amigos atrasavam e perdíamos a chance. Confesso um pouco de preguiça da batalha por uma refeição. Meu imaginário de conforto com a comida não inclui horas sentada em um banquinho na frente de um restaurante esperando a vez. Prá mim, tem que ser mais fácil.
Foi que, um dia da semana qualquer, um horário x onde normalmente estaria trabalhando, aconteceu de tudo ter saído às avessas. Convidei meu marido, e ele, que sempre recusava a ideia do Mani tão complicado, topou. Ainda falou : mas, assim, tão descomplicado? Pensei: é, assim mesmo. E repliquei: e vamos logo antes que fique tarde. Era cedo, ainda.
E foi assim que foi. Ele quis sentar mais para dentro, mas a única opção disponível era uma mesinha bem na entrada do restaurante. As restantes, reservadas! Tudo bem, topamos. E, aí, foi uma surpresa atrás da outra. Prezo muito o conhecimento, mas, as vezes as técnicas ocupam lugar demais e o resultado é uma comida perfeita, sem emoção. Diante de tudo fica faltando alguma coisa essencial. Estudei junto com uma querida, a Yolanda,  que em meio a 5 ou 6 produções complicadas para entregar, em uma cozinha cheia de gente ávida por mais técnicas, dizia: `que saudades do caldinho sem técnica da minha mãe!`. A gente ria, mas essa frase dizia tudo. Você pode ter muitos recursos, mas o calor do coração é único, e, sem ele, não dá!
No Mani eu encontrei uma combinação muito legal. A paixão pelo fazer vem junto para a mesa. E o que é bonito, fica lindo. O que é gostoso, fica incrível. E o que é criativo surpreende porque tem humor e engenho. Parece que dá prá ver a cara o do cozinheiro vibrando com o resultado final de sua obra. Vocês podem me achar maluca, mas isso vem servido no próprio prato. E ai, o coração e a mente vibram juntos!
Minha entrada chamava salada Waldorf e tinha gelatina de maçã com com sorbet de aipo, nozes e emulsão de gorgonzola. Tudo junto e ao mesmo tempo. Meu prato principal eram maniocas: vários tubérculos cozidos no vapor com espuma de tucupi e leite de coco, montados como uma fogueirinha de São João. E a sobremesa, escolhi pelo nome, para saber onde eu ia parar. Era doce de berinjela defumada, com sorvete de gergelim preto, gelatina de flor de laranjeira, coalhada de leite de cabra, crocante de massa filo e pistache. Como na gastronomia a última impressão é a que fica, uma sobremesa tão hiperbólica pode ser resumida em uma palavra: sensacional!